Tunísia: Protestos nas ruas e ruptura da coligação Nidaa Tounes-Ennahdha

Protestos no berço da Primavera Árabe

O ano de 2018 não começou da melhor maneira na Tunísia. Sete anos depois do início da Primavera Árabe, voltaram os protestos em algumas cidades do país (a maioria das quais no interior, negligenciadas pelo governo) por causa do Orçamento de Estado para 2018, que prevê políticas de austeridade, entre elas novas subidas de preços e impostos. Os manifestantes, quase todos estudantes ou desempregados, têm-se envolvido em confrontos com as autoridades, resultando, até ao momento, na morte de uma pessoa em Teboura.

Entretanto, o primeiro-ministro Youssef Chahed já veio dizer que as circunstâncias económicas do país são extraordinárias e que 2018 será o último ano de austeridade. A crise económica tunisina já dura desde 2011, sem dar quaisquer sinais de melhoria.

Uma parte da população do país está desiludida com a elite política, no poder desde Outubro de 2014. Querendo reacender o espírito da Revolução de Jasmim, surgiu o movimento Fesh Nestannew? (na sua tradução “de que estamos à espera?”), exigindo emprego, liberdade e dignidade nacional.

Nidaa Tounes e Ennahdha: Cada um por si

Os dois maiores e mais influentes partidos da Tunísia pós-Ben Ali tinham uma aliança/coligação desde o final de Outubro de 2014. Dia 6 de Janeiro, num comunicado na sua página oficial no Facebook, o Nidaa Tounes anunciou que a sua aliança com o Ennahdha não se manterá para as próximas eleições municipais – as primeiras após a Primavera Árabe -, marcadas para dia 6 de Maio. O comunicado refere que as listas eleitorais do partido social-democrata “estão abertas a qualquer pessoa competente que deseje defender o projecto de um estado civil e moderno”, contrariando assim a linha de acção do islâmico Ennahdha.

A decisão do Nidaa Tounes já era esperada desde o fracasso, em meados de Dezembro, do seu candidato às eleições parlamentares parciais na Alemanha. Esta formalização da interrupção surge no mesmo texto onde o Nidaa Tounes refere o “papel construtivo desempenhado pelo partido na discussão da Lei do Orçamento de 2018 e na manutenção da estabilidade das instituições políticas”.

Mourad Dellech, presidente da comissão jurídica do Nidaa Tounes, referiu que “nunca se falou de uma aliança política, mas sim de participar na composição de um governo, tendo em conta o resultado das eleições, respeitando o Acordo de Carthage que deu vida ao governo unidade nacional”. Dellech não põe de parte a existência de sacrifícios políticos por parte do seu partido pelo bem e estabilidade da Tunísia, no entanto considera necessário focarem-se em ganhar eleições.

O Nidaa Tounes tornou-se, desde a sua fundação em 2012, uma alternativa ao Ennahdha para muitos eleitores. Ainda assim, os comentadores tunisinos acreditam que apenas o partido islâmico tem uma estrutura capaz de se apresentar nas eleições para os 350 círculos eleitorais.

É unânime, entre os dois partidos, que “o governo de unidade nacional pode continuar mesmo que o Nidaa Tounes tenha decidido quebrar a sua aliança política com o Ennahdha”, sendo que “a última palavra é de Youssef Chahed”, o único capaz de remodelar o seu governo em caso de necessidade, mantendo-se sempre fiel ao Acordo de Carthage.

Também Rached Ghannouchi, líder do partido islâmico Ennahda, frisou que o seu partido e o do presidente Beji Caid Essebi não se fundiram num só e que competem de forma respeitosa: “somos capazes de transferir os conflitos violentos para desentendimentos legais e constitucionais, competindo como partidos políticos”.

Primeiro-ministro tunisino, Youssef Chahed. Photo by J. Marchand / CC BY 2.0

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Mónica Canário

Research Assistant at CEI-IUL. Ph.D. Candidate in Political Science, specialisation in International Relations (ISCTE-IUL).

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