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A vitória de Emmanuel Macron

Os resultados eleitorais

O movimento República em Marcha de Emmanuel Macron foi o grande vencedor das eleições legislativas francesas. Em coligação com o Movimento Democrático (mais conhecido como MoDem), assumiram a dianteira das eleições disputadas a 18 de junho. Logo após a vitória, a maioria absoluta conseguida pelo partido de Macron pareceu dar ao líder centrista a estabilidade de que precisava para governar – no entanto nem tudo são rosas no Eliseu, e o presidente francês já perdeu quatro dos seus ministros, que alegaram “razões éticas” para renunciar o cargo. No cerne dessa decisão parece estar o estalar de um escândalo dentro do MoDem, relacionado com a má utilização de fundos do Parlamento Europeu, que estariam a ser utilizados para fins pessoais.

O Movimento En Marche – que se vai tornar partido apenas em julho deste ano – conquistou 361 lugares na assembleia, seguindo-se dos Republicanos, com 126 lugares e da coligação França Insubmissa/ Partido Comunista francês com 26 assentos parlamentares.

Uma das derrotas mais duras desta primeira volta foi a do Partido Socialista, que passou de 300 lugares na Assembleia para apenas 46. Já a Frente Nacional de Marine Le Pen, candidata que disputou a segunda volta das presidenciais contra Emmanuel Macron conseguiu uma bancada parlamentar com oito deputados.

Estas eleições foram ainda marcadas por uma alta taxa de abstenção: 56.6% dos franceses preferiram não votar, o que revela, por si, uma certa descrença em relação ao atual modelo político francês. Fazendo um paralelismo com as eleições presidenciais de há pouco mais de um mês, reparamos no crescimento exponencial da taxa de abstenção, que na segunda volta rondou os 30% — o que também é revelador da crescente perda de autonomia das eleições legislativas face às presidenciais.

Uma mudança na paisagem política francesa

Estes resultados mostram que a paisagem política em França está a mudar. Prova desta mudança está no movimento República em Marcha que tem vindo a ganhar força desde a sua fundação, há pouco mais de um ano, e que agora se apresenta com toda a sua pujança. O modelo da alternância, que o Partido Socialista e os Republicanos (antigo UMP) disputavam entre si, parece estar moribundo. Neste momento, parece não haver em França uma real oposição ao partido de Macron.

Tanto os socialistas quanto os republicanos estão a atravessar crises ideológicas e precisam de se reformar internamente. Os seus resultados representaram um fiasco político e são apenas exemplos da falta de confiança nos seus projetos por parte do eleitorado. Para esta falta de confiança contribuiu também os vários casos de corrupção que atingiram a classe política francesa.

De acordo com Behrent (2017), foi o facto de Macron dar ao eleitorado um mix entre a esquerda e a direita tradicionais que lhe valeu a popularidade de que goza entre o eleitorado e a sua posterior vitória.  A distinção entre a esquerda e a direita tem sido objeto de debate recorrente, não só na sociedade francesa, mas também na Academia. Este autor admite que o cenário político francês tende para a direita, num fenómeno conhecido como “droitisation” da política gaulesa.

A crise na Esquerda

Esta tendência teve consequências duras para o Partido Socialista e pode ajudar a explicar o cenário atual. O autor defende que foi por volta de 1983 que o Partido Socialista começou a enfrentar uma das suas maiores crises. Diz Behrent (2017) que para se renovarem, os socialistas experimentaram várias soluções “ni a droite, ni a gauche”, mas que não foram particularmente bem-sucedidas. A juntar a isso, o autor sublinha que houve uma rutura interna de base ideológica que acabou por distanciar o partido dos seus militantes. “That the socialist government has repeatedly strayed into territory that has long been the preserve of the right and even the far right can be explained by a number of factors. The Socialist Party’s membership now consists of top civil servants and career politicians rather than the militants who still filled its ranks through the Mitterrand era. At the same time, the party’s commitment to the European Union places serious limitations on its ability to pursue traditional Keynesian policies. Yet perhaps the most decisive factor in the socialists’ rightward drift has been their almost complete rupture with the working class” (Behrent, 2017).

A rutura da esquerda e a descrença no socialismo já era evidente no mandato de Hollande: “Meanwhile, on the left, François Hollande – faced with increasingly lower support levels – hoped that he could turn things around somewhat and offer satisfactory enough answers to unemployment, terrorism, the refugee crisis, and a divided Socialist Party to reverse his low popularity ratings.” (Hainsworth, 2017). Portanto, fazendo uma análise mais alargada, os resultados destas eleições legislativas não são surpreendentes. São apenas a face visível de um descontentamento com o socialismo que jazia latente.

Indefinição à Direita

À direita o cenário não é melhor. A direita gaulesa sempre foi caracterizada pelas suas divisões, que se tornar mais óbvias agora que duas dezenas de deputados de Os Republicanos decidiram formar um grupo parlamentar autónomo, em associação com os centristas de direita da União de Democratas Independentes. Apesar de, em termos ideológicos, se encontrar mais bem resolvida do que os socialistas, continua a não saber dar resposta a dois problemas vitais: o seu compromisso com o liberalismo económico é problemático para o eleitorado porque, historicamente, as suas tentativas de implementação foram fracassadas; por outro lado, em termos identitários, a direita tem alguma dificuldade em distinguir-se da extrema direita. No entanto, o eleitorado parece apostar mais nos republicanos do que nos socialistas.

Que futuro para Macron?

O resultado destas eleições legislativas permite afirmar que foi a falta de respostas convincentes tanto da esquerda quanto da direita que ditaram a preferência da população francesa por uma solução híbrida, que se afirme abertamente centrista, e que deixe para trás o histórico de soluções falhadas apresentadas pelos dois lados da barricada. No entanto, coloca alguns problemas: o que farão os franceses sem uma oposição? Será que, apesar dos resultados positivos, Macron vai mesmo ter a estabilidade de que precisa para governar?

Bibliografia utilizada
  • Behrent, M. (2017). Twilight of the political? On the ideological. Modern & Contemporary France, 25:1, 75-81.
  • Hainsworth, P. (2017). Swings and Roundabouts, Ups and Downs: The French Presidential Election of 2017. Political Insight, 30-32.
Photo by Lorie Shaull / CC BY-SA 2.0

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Inês Chaíça

Student at the Master in International Studies (ISCTE-IUL). Undergraduate degree in Communication Sciences.