Amanda Hammar: “As pessoas ainda respeitam Mugabe por ter sido o libertador”
Entrevista a Amanda Hammar, académica zimbabweana que é professora visitante no ISCTE-IUL. Fala do otimismo criado em torno de Mnangagwa, o novo presidente, e conta como Robert Mugabe passou de herói nacional a líder obcecado com a sua permanência no poder.
Foi entrevistada em Lisboa horas depois de Emmerson Mnangagwa ter tomado posse sexta-feira como presidente do Zimbabwe. Professora visitante no ISCTE-IUL, a zimbabweana Amanda Hammar (Harare, 1959) não escondia o entusiasmo pela mudança que está a ocorrer no seu país, destacando o tom inclusivo do discurso de Mnangagwa. Ela que cresceu sob o regime branco de Ian Smith e depois trabalhou para o governo dos primeiros anos do novo Zimbabwe de Mugabe, critica o fundador do país mas também alerta que este continua a ser respeitado por muitas pessoas, até pelos seus rivais.
Para si, como zimbabweana, é possível ser otimista quando alguém com o cognome de “crocodilo” assume a presidência do seu país, que tem tantos problemas para resolver no pós-Mugabe?
Sim, é possível ser otimista. Claro que tenho de reconhecer que Mnangagwa fez parte da máquina que foi controlada por Mugabe durante todos estes anos. E uma máquina que sempre exerceu a violência. Mas este momento nada tem que ver com o que havia há dois anos ou mesmo há duas semanas. Mnangagwa compreendeu que há uma oposição muito diversificada no Zimbabwe e que há que tê-la em conta. E isso percebeu-se no discurso que fez de tomada de posse. Ele quis mostrar que não estava ali só para assegurar a continuidade da gestão da ZANU-PF. Mesmo antes de ser presidente, na outra mensagem depois de ter sido demitido a 6 de novembro de vice-presidente, ele já me tinha surpreendido pelo tom inclusivo. Claro que ele é quem é, mesmo que o tenha feito às ordens de Mugabe, mas tem-se expressado como alguém que compreendeu que é o futuro do próprio Zimbabwe que está em causa agora. Assim, não me sinto cegamente otimista, mas sinto-me otimista. E, como já afirmei, o discurso foi incrivelmente inclusivo e conciliador, não foi nada partidário mas sim do género vocês, eu e todos nós.
Sim, sim. Ele tem um papel de pivô. E falou de democracia, de eleições justas a serem realizadas, de respeito por todos os cidadãos, negros ou brancos, também sobre a criação de empregos, empregos, empregos, que é essencial, e reafirmou não ser tempo para muitas palavras mas, como se diz na nossa terra, sim para pôr os pés no chão e começar a correr. A mensagem foi de querer trabalhar com toda a gente para construir um novo Zimbabwe. E não me pareceu mera retórica, mas sim algo muito sólido. Percebo que o MDC, o tradicional partido da oposição, esteja muito cauteloso e suspeitoso, mas ouvem-se muitas vozes fora da ZANU-PF a dizerem para deixarem este homem trabalhar, para vermos o que faz.
Sabe se tem havido contactos do novo presidente com Morgan Tsvangirai, o já clássico opositor de Mugabe?
Creio que sim, mesmo que nos bastidores. E isto ainda antes talvez do afastamento de Mugabe. E não só com Tsvangirai, mas com outras figuras da oposição, como Joyce Mujuru, gente que tem círculos de apoios muito fortes. O MDC fragmentou-se muito nos últimos anos e deixou de se poder falar numa oposição única e unida contra Mugabe. E Joyce Mujuru, que foi a outra vice-presidente demitida em 2014 por causa de Grace Mugabe, fundou o seu próprio partido.
Então, apesar do controlo do país por Mugabe, a sociedade zimbabweana conseguiu tornar-se pluralista?
Sim, mas sempre muito condicionada pela polarização ZANU-PF e MDC.
E o que pensa que vai ser o futuro de Mugabe aos 93 anos? Ficará a viver no país, tratado como um respeitável ex-presidente e pai da independência?
O importante é que lhe tenha sido dada a possibilidade de escolher. Sei também que lhe foi garantida imunidade, assim como a Grace Mugabe, o que é perturbador, mas será a forma de não complicar a situação.
Leia a entrevista completa no site do jornal Diário de Notícias.
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