Merkel por mais quatro anos
Se pensarmos na perspectiva de um eleitor alemão, olharmos para os indicadores económicos e para a forma como a Alemanha acumulou poder no quadro europeu, é compreensível a sua previsível vitória.
No início do ano, num momento em que vivíamos projecções apocalípticas a propósito dos destinos da Europa, ninguém arriscaria prever um Setembro tão calmo para Angela Merkel. O referendo que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia e a eleição de Donald Trump, no ano passado, faziam temer o pior e alentavam os sonhos da extrema-direita em França e na Holanda. Na Alemanha, a chegada ao poder do neo-fascismo nunca foi uma possibilidade real, mas o efeito “bola de neve” de uma (não verificada) hecatombe em França teria sido imprevisível e poderia ter aumentado em muito as perspectivas de um bom resultado da cada vez mais radicalizada Alternativa Alemã.
Merkel talvez seja mesmo o último exemplo de um político de outra geração. Quando chegou a chanceler, o veterano Jacques Chirac era o Presidente francês e Tony Blair primeiro-ministro do Reino Unido. Pelo que sabemos da sua ascensão ao poder, e ao contrário do que muito se escreveu depois, a chanceler não tinha qualquer projecto de expansão do poderio do seu país na Europa. Viviam-se tempos de alguma estabilidade e de superação de uma primeira vaga de problemas orçamentais em alguns países. No entanto, a crise económica e, sobretudo, a crise das dívidas soberanas veio alterar os pressupostos da política europeia e colocar sobre os ombros de Merkel um poder desmesurado.
Numa Europa onde, por agora, os “canhões” contam bem menos do que a robustez das finanças públicas e do que a pujança industrial, a permanente crise francesa fez o resto, diluindo, em termos práticos, o eixo franco-alemão. Angela Merkel ficou sozinha a coordenar (ou a governar) uma zona euro a braços com uma série de países à beira da ruptura financeira. Um quadro politicamente inesperado e juridicamente não previsto em nenhum tratado permitiu que a economia mais poderosa da união monetária improvisasse, criando regras para solucionar crises e aplicando-as com amplo grau discricionário. Os países endividados, cilindrados pelos implacáveis e incontroláveis mercados, não tiveram mais remédio que não subordinar-se e assumir a correspondente cedência de soberania. A União Europeia não voltou a ser a mesma.
Leia o artigo completo de Filipe Vasconcelos Romão no site do jornal ECO.
Photo by Phillip / CC BY 2.0
This work is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.