Mind the Gap: à terceira ainda não foi de vez!
Terminou na passada quinta-feira, dia 31 de Agosto, a terceira ronda de negociações do Brexit com Michel Barnier, o negociador-chefe da UE, a pedir mais clareza e seriedade e o seu homólogo Britânico David Davis a insistir em mais flexibilidade e tempo. Não admira, por isso, que se acalente cada vez mais a ideia que, para além do debate entre um soft ou hard brexit, o Reino Unido parece caminhar para uma terceira via: o no brexit. Em Julho, já tinha sido manifesto o gap de expectativas entre britânicos e europeus quando uma fotografia denunciava simbolicamente que o Reino Unido não parecia verdadeiramente comprometido em apresentar propostas substantivas nem em consensualizar internamente qual o caminho a seguir.
Por sua vez, Bruxelas continua empenhado que as negociações em 2017 se centrem exclusivamente na determinação dos termos da separação propriamente dita em relação a três assuntos principais: o primeiro, a fatura contributiva que Londres terá que liquidar (números divergem entre os 40 e 100 milhões de euros) para honrar os compromissos assumidos enquanto membro da UE, sendo que nem os montantes nem o método do cálculo foram ainda definidos juridicamente; o segundo, as garantias a assegurar aos cidadãos europeus a residirem e/ou trabalharem no Reino Unido e os britânicos a residirem e/ou trabalharem na UE; e terceiro, mas não menos importante, a fronteira terrestre entre o Reino Unido e a UE, ou seja, entre a Irlanda do Norte e a Republica da Irlanda. Só posteriormente, Bernier aceita estabelecer os arranjos transitórios para evitar as lacunas de uma passagem abrupta entre os estatutos atual e futuro (2ª fase) e definir o quadro de relacionamento futuro entre a UE e o Reino Unido enquanto Estado terceiro (3ª e última fase). E é aqui que se faz sentir o gap estrutural desta relação: enquanto Bruxelas quer definir os pressupostos de base, os britânicos estão concentrados já nas modalidades de saída e nos futuros acordos aduaneiros ou troca de dados.
Ora, não obstante alguns avanços em relação ao estatuto dos trabalhadores fronteiriços, a agregação dos direitos de segurança social e aos processos judiciais pendentes perante o Tribunal de Justiça, após as três rondas já realizadas o braço de ferro ainda não foi de todo ultrapassado. Assim, a cimeira em finais de outubro calendarizada para discutir os primeiros acordos em matéria económica parece estar comprometida, bem como o calendário do Brexit aprovado pelas instituições comunitárias.
Entretanto, Theresa May continua no seu périplo para encontrar aliados para um acordo comercial pós Brexit depois de, à margem da Cimeira do G20, Trump ter assumido a expectativa de um acordo rápido e poderoso para ambos os países. Esta semana, a primeira ministra britânica visitou Tóquio com uma mensagem clara: a Nissan e a Toyota podem continuar a consolidar-se no mercado britânico (o segundo mais importante para Tóquio, depois dos Estados Unidos) mesmo num cenário pós Brexit. Palavras que parecem ter acalmado os empresários japoneses e Shinzo Abe que acedeu a um acordo formal entre o Reino Unido e o Japão, em traços similares ao acordo comercial que o Japão firmou dia 5 de Julho passado e que foi anunciado como o maior acordo comercial jamais assinado entre a UE e um país terceiro.
Mas a verdade é que o risco de exposição das empresas a um cenário de incerteza e opacidade que se poderá prolongar pelo menos nos próximos dois anos tem levado a estratégias de antecipação concertadas de várias empresas multinacionais. De facto, o presidente da Câmara de Indústria e de Comércio alemã (DIHK), Martin Wansleben, receia o aumento da burocracia, dos tempos de espera, dos controlos fronteiriço, bem como dos custos e, por isso, admitiu que muitas das empresas já estão a retrair o seu investimento no Reino Unido.
A sessão de divórcio está agendada para Março de 2019. Até lá, perceberemos se as partes convergem numa solução amigável ou litigiosa ou até se o arrependimento mata à partida qualquer compromisso futuro.
Photo by David Holt / CC BY 2.0
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