Religiões ou Sistemas Políticos? Não Comparar o Incomparável
Os objetivos anunciados pelos Jiadistas Radicais não são sobre a maior importância de uma religião sobre outras.
A confusão é normal. Afinal, na esmagadora maioria das sociedades, Estado e Religião estão, na atualidade, separados ou, pelo menos, com áreas de influência claramente identificadas, para que não haja subordinação política de umas sobre as outras. Mas quando lemos as reações públicas aos ideais extremistas anunciados por grupos como o Boko-Haram, o Daesh, a al-Qaeda ou o al-Shabab, somos levados a pensar que são apenas supostos anúncios de uma hipotética superioridade de uma religião sobre as restantes, mas não são.
Estas ideologias de base religiosa, que apenas são apenas explicadas de uma forma radical e fundamentalista tipo “Carijita”, como argumentei no Respostas ao Jiadismo Radical e como afirmam os grandes líderes corajosos dentro das comunidades islâmicas (como vimos, recentemente, nas declarações frontais do Rei da Jordânia não são o anúncio de uma religião mas, fundamentalmente, de um sistema político totalitarista baseado numa visão religiosa radical.
O que estes grupos apresentam, como linha fundamental da sua ação política, são os fundamentos radicais de uma visão para administrar a vida de milhões de cidadãos em vastas regiões do mundo e, se possível, sobre todo o mundo.
Um sistema político de governação, de vida em sociedade, com leis morais e de direito, rígidas e absolutas, com elementos que incluem todas as dimensões da atividade social. Entre outras referências deste extremismo visionário temos a célebre obra de Abu Bakr Naji (2006), The Management of Savagery: The Most Critical Stage Through Which the Umma Will Pass. Nesta obra propõe-se, de forma clara, como deve ser gerida a vida dos “selvagens”, que são (somos) todos os que não vivem de acordo com os preceitos radicais islâmicos anunciados, além de mostrar como a sociedade tem de ser organizada.
O argumento usado por estes jiadistas radicais não passa por recomendações, ou por sugestões, de entendimento de uma determinada forma de viver uma religião. Pelo contrário, apresenta, exige, como única solução, um sistema político completo para a administração da sociedade. Na obra de Nadji, podemos ler como todos os “selvagens” estão (estamos) a viver em regimes políticos imperfeitos e incompletos, pecadores e abjetos do ponto de vista moral. A solução é um sistema político que controle a educação dos temas autorizados e necessários, numa única forma económica e financeira, numa sociedade regulada nos seus direitos e leis absolutas (Sharia) que se aplica a todos sem fronteiras físicas ou distinções étnicas – a Umma só poder ser uma e mesmo, para os que não aceitarem os preceitos religiosos, oferece-se uma hipótese de subordinação dentro deste sistema político, desde que se pague um imposto.
Não podemos por isso comparar o incomparável, ou seja, comparar religiões, fé e crenças com projetos políticos de gestão social.
Ou comparamos políticas com políticas (mesmo que baseadas em religiões) ou discutimos questões de fé. Por isso é gravíssimo confundir o Islão com esta face minoritária de extremistas que não pensa numa religião, mas sim aposta tudo em projetos de poder. Confundir jiadistas radicais com muçulmanos é ofensivo e profundamente errado.
Não podemos continuar a ignorar que, verdadeiramente o que nos exigem os jiadistas radicais, não é nem uma interpretação religiosa nem uma solução de justiça social, mas um sistema político totalitarista que controle todas as manifestações sociais dos cidadãos que nele, voluntariamente ou forçosamente, se incluírem. Não é uma comparação entre religiões, nem uma discussão sobre opções sociais, é uma imposição de um sistema político.
ISIS fighters, Photo by Day Donaldson / CC BY 2.0
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