Uma Antecipação nos Objetivos Gerais do Jiadismo Radical?
No meu livro Resposta ao Jiadismo Radical (Nexo, 2016), alerto para os grandes objetivos perseguidos por grupos, como a al-Qaeda e o Daesh, que repetem os argumentos defendidos por Sayyid Qutb em 1964 no seu livro Marcos Miliários, das três grandes etapas para atingir a vitória:
Primeiro tem que se conseguir consolidar a Umma (comunidade dos crentes) nos países de maioria muçulmana, revitalizando o verdadeiro Islão, afastando os governos corruptos e expulsando os infiéis. Em segundo lugar conseguir refazer o califado histórico, numa versão agora alargada desde a Península Ibérica até aos confins da Ásia (Na revista Dabiq nº 1, de propaganda do Daesh, estão os passos defendidos por Zarqawi, o líder carismático da Al-Qaeda no Iraque, antecessora do Daesh, embora Sayyid Qutb (p. 5) alerte que ainda faltarão alguns séculos para que o Islão esteja em condições de competir contra a supremacia da Europa em termos de inovação tecnológica. A terceira, e finalidade última, seria um mundo sob dominação neo-salafista radical.
A consolidação da Umma
Do que temos vindo a observar, a ação política e estratégica de grande parte dos grupos jiadistas radicais tem-se centrado na primeira das fases, o da consolidação da Umma. De facto parece que esta fase está a correr bem: grande parte dos denominados infiéis já abandonaram os países Muçulmanos (basta ver que os 20% de cristãos que existiam nestas regiões no início do século XX estejam agora reduzidos a uns meros 4%) e que as campanhas de ações terroristas lançadas sobre os Países dos infiéis têm levado muitos dos invasores a sair mas, por outro lado, a governação da maioria dos países não está nas mãos de radicais.
Parece então que estamos ainda nesta fase mas, o último número da Dabid, nº 15, publicada em Julho de 2016 vem alterar a narrativa das últimas décadas dedicando completamente o texto contra o Ocidente e a religião Cristã. O título não poderia ser mais sugestivo – Quebrar a Cruz (Break the Cross). São 82 páginas totalmente dedicadas atacar os fundamentos da religião Cristã, envoltas em argumentos apelativos para que cada um dos verdadeiros muçulmanos faça a sua Jihad nos lugares onde vive e ataque, sem piedade, quem professe esta religião. É um apelo a novos adeptos, aos lobos solitários, a intimar ainda mais os habitantes destes países.
Estaremos na segunda fase, a do ataque aos países dos cruzados para se reconstituir o Califado Histórico?
É difícil responder, o aumento de ataques em solo europeu e americano nos últimos dois anos pode ser um indicador forte mas não parece que se possa passar a uma segunda fase sem que a primeira esteja, minimamente, consolidada. Embora muitos dos infiéis tenham de facto saído de países Muçulmanos, o outro objetivo que passava por derrubar os governos apóstatas e corruptos e substitui-los por governos neo-salafistas radicais, está longe de ser verdade. “O caminho para a construção da Fé será muito longo e gradual. Cada passo terá de ser dado com firmeza” (Qutb, 1964: 29).
Assim, esta anunciada antecipação de ataque aos cruzados não passa, por enquanto, de uma resposta de um grupo, o Daesh, que se vê acossado em todas as direções, a perder território nas vastas regiões que ocupa mas que não domina e, que cada vez, menos tem. É um anúncio de uma nova fase que nos deve preocupar, mas não é certamente a passagem à mesma.
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