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A ascensão da nova extrema-direita na Alemanha

As recentes eleições para o parlamento regional do Land de Berlim (19 de Setembro de 2016) confirmaram o crescimento do populismo de direita também na Alemanha. Os 14% dos votos ganhos pela Alternative für Deutschland (AfD) no bastião da esquerda liberal corrobora a dinâmica positiva preanunciada pelos resultados na Saxónia-Anhalt (24% em Março de 2016) e no Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental (20,8% em Setembro de 2016).

Uma ‘Alternativa para a Alemanha’?

Surgida apenas em 2013, a AfD está a demonstrar uma forte capacidade de atracção junto do eleitorado de direita, desiludido com a chanceler Angela Merkel (CDU), principalmente na gestão da crise dos refugiados junto da União Europeia. Inserida no mais amplo fenómeno do populismo de direita em acensão em diversos países da UE, o caso da AfD desperta particular interesse nos analistas políticos e nos opinion-makers, devido à comparação inevitável com o Nacional-Socialismo, presença incontornável na história política nacional e europeia.

O caracter não homogéneo das direitas radicais europeias

A investigação científica sobre o radicalismo de direita na segunda metade do Século XX e princípio do Século XXI encontra-se hoje num estádio suficientemente consolidado para permitir uma análise mais complexa de fenómenos como o da AfD. O ponto central da análise é o caracter não homogéneo das direitas radicais europeias que se sucederam nas arenas políticas nacionais desde 1945.

Nesse sentido, existe uma distinção macro entre uma velha extrema-direita, ainda ancorada aos autoritarismos da primeira metade do Século XX, e uma nova extrema-direita que recusa aquele legado histórico e se identifica com os princípios da democracia liberal. Esses dois conjuntos de partidos com agendas parcialmente convergentes, mas identidades assaz diferentes, manifestaram-se através de vagas sucessivas a partir de 1945.

A primeira vaga de extrema-direita no imediato segundo pós-guerra foi protagonizada por veteranos dos regimes autoritários derrotados na Guerra Mundial (e.g., Movimento Sociale Italiano).

A segunda vaga emergiu entre os anos Cinquenta e Sessenta do Século passado, através de partidos de protesto face ao intervencionismo estatal na economia e, principalmente, ao aumento da imposição fiscal (e.g., o partido de Pierre Poujade).

A terceira vaga consolidou-se entre as décadas de Setenta e de Oitenta, graças a partidos críticos das primeiras ondas migratórias extraeuropeias e do processo que conduziu ao Tratado de Maastricht (e.g., Front National francês).

A nova vaga de partidos de extrema-direita

Na viragem do século, o alargamento da EU a Leste, o agravar da crise económica, o aumento dos fluxos migratórios e a difusão do terrorismo global pós-11 de Setembro, proporcionaram as condições para uma nova vaga de partidos de extrema-direita, com agendas identitárias vincadas (antieuropeístas, anti-imigratórias e anti-islâmicas).

Embora nessa derradeira vaga coexistam partidos da velha extrema-direita (e.g., o húngaro Jobbik e o grego Aurora Dourada) e partidos da nova extrema-direita (e.g., a FN de Marine Le Pen, o partido de Geert Wilders, o UKIP britânico), apenas esses últimos apresentam performances eleitorais significativas com possibilidade de influir nas respectivas cenas políticas nacionais.

A capacidade de atracção do eleitorado

A explicação do seu êxito reside na capacidade de alinhar a identidade de base do partido à cultura política dominante na Europa – liberal, cívica, secular – e de moldar o seu discurso político através desses princípios. Assim, estes partidos não se apresentam como uma alternativa substancial ao modelo político-económico vigente: a democracia liberal representativa e a economia de mercado.

Isso permite-lhes maximizar a sua oferta junto das cada vez mais amplas faixas de eleitorado afectadas pela globalização e sensíveis aos apelos para uma maior democracia directa (referendos, eleições primárias, etc.), para a restrição do acesso ao Estado providência face à imigração (princípio da preferência nacional), para a salvaguarda da autodeterminação política e cultural face a factores percepcionados como ameaças externas (UE e Islão).

A capacidade de permanecer dentro do quadro de referência liberal para atacar as contradições do humanitarismo universalista e do multiculturalismo representa a distinção entre a nova extrema-direita em ascensão e a velha extrema-direita em declínio.

A nova extrema-direita alemã

O caso alemão enquadra-se nessa análise: o sucesso da AfD não deve ser lido como a reemersão do nacionalismo revanchista e anti-democrático latente na Alemanha desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Este último, pelo contrário, é corporizado pelo histórico partido neo-nazi Nationaldemokratische Partei Deutschlands (NPD), que, não por acaso, vegeta na marginalidade desde a sua fundação na década de Sessenta.

Photo by Metropolico.org / CC BY-SA 2.0

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Riccardo Marchi

Post-doctoral researcher at CEI-IUL. PhD in Modern and Contemporary History (ISCTE-IUL). Research interests: right-wing radicalism (political thought, parties and movements) and the relations between States and radical organizations in contemporary Europe.