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Amém, candidato!

Disputam-se, por estes dias, à margem das campanhas presidências, as campanhas para eleger os deputados federais e estaduais no Brasil. Embora as mesmas pareçam de menor importância diante das vitais eleições presidenciais, em que os cidadãos irão eleger o sucessor de Michel Temer – numa corrida onde Lula da Silva lidera as intenções de voto, seguido do ultraconservador e defensor da ditadura militar, Jair Bolsonaro –, a verdade é que na composição do tecido político brasileiro, na importância estratégica política, ideológica, social e cultural dos estados e dos municípios, essas eleições são determinantes para aferir os caminhos da democracia brasileira.

Ora, é precisamente aí, talvez de forma mais veemente que uma eventual eleição de Bolsonaro, que serão jogadas as mais decisivas cartadas na estruturação da teia política do país.

Um olhar cauteloso ao panorama social brasileiro destaca a forte presença da religião na estruturação político-social, dos municípios ao Senado. Num país onde a liberdade religiosa sempre deu pequenos passos e enormes saltos de retrocesso, o crescimento exponencial das igrejas neopentecostais e a sua penetração na política constituem um dos maiores entraves atuais à democracia plural no Brasil. Com taxas de crescimento acima dos 70 por cento, tais igrejas conquistam, de uma assentada, devotos e eleitores, engolindo as possibilidades de uma democracia plural e integrativa, para cerrar fileiras ideológicas em torno da família heterossexual, da moralidade cristã-evangélica, do desprezo pelas minorias étnicas, religiosas e sexuais, num movimento dramaticamente incomparável no Ocidente.

A promiscuidade entre poder político e intenções missionárias-ideológicas evangélicas está patente no elevado número de candidatos que se anunciam pelo título de “pastor”, “bispo”, “irmão”, “missionário”, e outras designações. O Partido Republicano Brasileiro (PRB), ligado à IURD (Igreja Universal do Reino de Deus), é um dos mais fortes partidos políticos em São Paulo e no Rio de Janeiro, onde tem por prefeito Marcelo Crivella.

A religião no Brasil deixou de dizer respeito à consciência dos cidadãos para participar ativa e determinantemente na política brasileira, funcionando como fator eleitoral.

Reconhecendo que é entre as camadas mais pobres da sociedade brasileira que tais igrejas vêm conquistando maior expressão, é fácil compreender que a palavra do pastor funcione como sanção, incontestável e autoritária, ungida por Deus. Reconhecendo o caráter expansionista e violento dessas igrejas, que vêm levando a cabo uma guerra santa contra as religiões de matrizes africanas e ameríndias, e inclusive à Igreja Católica, cada deputado eleito é um golpe profundo na Democracia.

Das leituras da Bíblia em plenários à alteração do nome das ruas para figuras bíblicas, assim vai o Brasil, entre o “amém, candidato” e o ataque ao demónio representado nas minorias.

Igreja da Assembléia de Deus em Imperatriz (Maranhão, Brasil) / foto de Jozeias3d / CC BY-SA 3.0

As opiniões expressas neste texto representam unicamente o ponto de vista do autor e não vinculam o Centro de Estudos Internacionais, a sua direcção ou qualquer outro investigador.

CC BY-NC-SA 4.0 This work is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.

João Ferreira Dias

Researcher at CEI-IUL. PhD in African Studies (ISCTE-IUL) about politics of memory, and cultural loss in the terreiros de Candomblé. Research interests: religious memory, nostalgic sentiments and cultural loss, the orthopraxy and thought patterns in jeje-nagô Candomblé, and the Yorùbá construction and religious and ethnic identity.