Ataques terroristas e vítimas na União Europeia entre 2006 e 2019
A análise que se segue está incluída na tese de doutoramento que me encontro a desenvolver, subordinada ao contraterrorismo em Portugal e Espanha no contexto da União Europeia (UE). Face aos recentes ataques, considerei pertinente divulgar algumas conclusões preliminares, de forma muito simplificada.
Qual é o tipo de terrorismo com maior impacto na UE? A fim de responder a esta questão, considerei cinco tipos de terrorismo – terrorismo jihadista; etno-nacionalista/separatista; extrema-direita; extrema-esquerda e “single issue” (relativo a causas específicas) – e analisei as estatísticas de todos os relatórios da EUROPOL sobre a situação e as tendências do terrorismo na UE (TE-SAT), referentes a um período de treze anos, entre 2006 e 2019. Da análise, destacam-se três variáveis:
(1) Número de ataques terroristas: Esta variável refere-se ao total de ataques concretizados (ataques executados na plenitude); falhados (ataques mal sucedidos por ação do grupo terrorista) e frustrados (ataques prevenidos pelas autoridades) na UE. Desconhecem-se os números para cada tipo de ataque. Entre 2006 e 2019, contabiliza-se um total de 3.689 ataques e, por ano, a média situa-se entre os 100 e os 200. Ao analisar os dados por tipo de terrorismo, verifiquei que o terrorismo etno-nacionalista/separatista é o que contabiliza o maior número de ataques na UE, registando um total de 2.619 naquele período. Segue-se o terrorismo de extrema-esquerda (390); jihadista (125); extrema-direita (31) e “single issue” (14). Contudo, contabilizam-se 436 ataques “não especificados”, o que pode perturbar estas conclusões.
(2) Número de vítimas: Entre 2006 e 2019, contabilizam-se 434 vítimas de ataques terroristas na UE e pelo menos 1.718 feridos. O terrorismo jihadista ocupa a primeira posição, com 399 vítimas, seguido do terrorismo etno-nacionalista/separatista (13) e os lobos solitários (2). Não se registam quaisquer vítimas nos restantes tipos de terrorismo.
(3) Número de detenções: Entre 2006 e 2019, prevalece o número de detenções relativas ao terrorismo jihadista, contabilizando-se 4.883. Segue-se o terrorismo etno-nacionalista/separatista (3.235); extrema-esquerda (669); extrema-direita (242) e “single issue” (13). Porém, existem 1.938 detenções “não especificadas”, o que limita a interpretação dos resultados obtidos.
Conclui que os tipos de terrorismo com maior impacto na UE são o terrorismo etno-nacionalista/separatista e o jihadista. Considerando os resultados e sabendo que, desde 2004 até à atualidade, a retórica europeia prioriza o terrorismo jihadista como a principal ameaça à União (comparativamente aos restantes tipos), pode afirmar-se que essa prioridade é justificada?
Por um lado, as estatísticas não justificam essa prioridade, por duas razões. Primeiro, porque o tipo de terrorismo com maior número de ataques terroristas perpetrados é o terrorismo etno-nacionalista/separatista, logo é a ameaça predominante. Segundo, porque as atividades da extrema-direita têm causado disrupções significativas: apesar do seu impacto não se refletir nem no número de ataques nem de vítimas na União Europeia, a EUROPOL alerta, desde 2006, que é um “desafio crescente” nos estados-membros, evidenciando a sua natureza violenta bem como as ligações internacionais dos grupos ativos em espaço europeu.
Por outro lado, a prioridade atribuída ao terrorismo jihadista justifica-se por três razões.
(i) O número de vítimas e de detenções relativas a este tipo de terrorismo superam os restantes nas mesmas variáveis.
(ii) O extremismo jihadista e as suas atividades são uma preocupação recorrente para a UE, das quais se destacam: a radicalização e recrutamento de cidadãos europeus; o retorno dos combatentes terroristas estrangeiros, provenientes da Síria e do Iraque; e os lobos solitários inspirados neste tipo de extremismo.
(iii) A resposta europeia é também elaborada com base no contexto internacional. Isto é um dado relevante porque, segundo as estatísticas do Global Terrorism Index (GTI), a ameaça preponderante, na Europa e Estados Unidos, é o terrorismo de matriz jihadista, tanto a nível de ataques perpetrados como de vítimas. Por exemplo, o último GTI (2019) refere que, excluindo os ataques do 11 de Setembro de 2001, “o terrorismo islamista é mais mortífero do que o terrorismo de extrema-direita, com 3.6 vítimas por ataque”.
O terrorismo é apenas um entre os vários desafios mundiais, mas mantém a centralidade como uma das principais ameaças à paz e segurança.
A ONU, por ocasião do seu 75º aniversário (2020), alerta para a emergência de uma “nova era de conflitos e violência”, na qual evidencia o impacto negativo do terrorismo e do extremismo violento nas sociedades. 699/700 palavras.
As opiniões expressas neste texto representam unicamente o ponto de vista do autor e não vinculam o Centro de Estudos Internacionais, a sua direcção ou qualquer outro investigador. Palmyra, Syria / photo by Bernard Gagnon / CC BY-SA 3.0
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