Dinâmicas do Pluralismo Jurídico em Moçambique: Estudo de Caso do Distrito de Mossurize
O pluralismo jurídico em Mossurize
A minha dissertação de Doutoramento intitula-se “Dinâmicas do Pluralismo Jurídico em Moçambique – estudo de caso do distrito de Mossurize”. O meu objecto de estudo é o pluralismo jurídico em Mossurize, que analiso através de um estudo de caso para compreender de que forma as populações deste distrito percepcionam a justiça, de que modo a pluralidade existente influencia essas representações e significados, e quais as práticas que os actores locais reproduzem em situações de resolução de conflitos.
Sobre Mossurize
Mossurize é um distrito rural de Moçambique que se localiza no centro do país, a sul da província de Manica, e na fronteira com o Zimbabwe. A capital do distrito, Espungabera, dista cerca de mil e cem quilómetros de Maputo e a proximidade com o Zimbabwe, à semelhança de qualquer região fronteiriça, faz com que as interligações deste distrito sejam mais frequentes com o Estado vizinho do que com o seu próprio Estado central.
Resolução de conflitos em Mossurize
Neste distrito, e ao nível da resolução de conflitos, as populações recorrem frequentemente às instâncias “tradicionais” ou comunitárias que deliberam de acordo com os “usos e costumes”. Todavia, as instâncias judiciais oficiais, como o Tribunal Judicial e a Procuradoria da República, também funcionam em Espungabera (embora de forma incipiente). Juntamente com outras instâncias reminiscentes de outros períodos históricos que o país atravessou, constituem uma pluralidade de instâncias judiciais que a Constituição da República de Moçambique legitima (artigo 4º: “o Estado reconhece os vários sistemas normativos e de resolução de conflitos que coexistem na sociedade, na medida em que não contrariem os valores e os princípios fundamentais da Constituição”).
Uma análise interdisciplinar
Na minha análise procurei conciliar uma perspectiva top-down, ou seja, assente no processo de construção do Estado e nos princípios subjacentes às diversas produções legislativas que regulamentam as relações entre o Estado e a sociedade, com uma perspectiva bottom-up, isto é, centrada nos actores sociais e nas suas práticas em conformidade, ou à revelia, das directivas estatais.
Para que esta fosse uma investigação o mais sistemática possível, optei por uma postura interdisciplinar sobre o pluralismo jurídico, numa abordagem que incorpora diferentes perspectivas e procedimentos, ao articular a Ciência Política com a Antropologia e com a História.
Para analisar todas as dimensões com profundidade empírica segui uma estratégia qualitativa assente no método do estudo de caso, o qual desenvolvi através de trabalho de campo e recorrendo às técnicas de entrevistas semi-estruturadas, histórias de vida, observação participante e não-participante. O enquadramento teórico, epistemológico, metodológico e histórico foi desenvolvido através de uma intensiva pesquisa e análise documental de fontes primárias e secundárias.
Relevância do estudo
A relevância deste trabalho deve-se ao facto de ele incidir sobre um distrito fronteiriço rural remoto da província de Manica sobre o qual pouco se tem escrito e onde se torna cada vez mais necessário compreender se a coexistência dos diversos mecanismos jurídicos representa efectivamente uma justiça mais próxima dos cidadãos e se contribui, ou não, para a democratização do acesso à justiça e para o alargamento da justiça social.
De facto, ao longo do texto avalio se o pluralismo jurídico representa uma reprodução do modelo de indirect rule preconizado pelo Estado colonial português, que impede a população de usufruir dos seus direitos fundamentais constitucionalmente consagrados, ou se, por outro lado, se trata de uma situação inultrapassável devido à resiliência da presença tradicional em zonas remotas e para à qual o Estado ainda não encontrou alternativas.
Uma vez que a administração da justiça é um dos atributos mais importantes do exercício do poder político, também analiso quais as repercussões das práticas do pluralismo jurídico em Mossurize para o Estado de Direito moçambicano, para o projecto de construção do Estado e para a sua soberania.
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