Marcelo Moriconi: “Falta uma discussão séria sobre o que é corrupção desportiva”
Marcelo Moriconi, investigador no Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa, falou com o DN falou sobre o que ainda falta fazer no campo da corrupção no desporto.
A luta contra a manipulação de resultados no desporto assume cada vez mais importância e recursos. No futebol, uma indústria que movimenta anualmente 26 mil milhões de euros, como adiantou recentemente ao DN o advogado Fernando Veiga, presidente da Comissão de Direito do Desporto da União Internacional de Advogados, essa preocupação congrega esforços a vários níveis e envolvendo governos, comités olímpicos, UEFA e FIFA. Foi neste contexto que ontem se realizou um debate no ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, com o tema “A nova resolução da ONU contra a corrupção no desporto e a perspetiva da luta contra a manipulação de resultados na Europa”, sob a moderação do investigador Marcelo Moriconi. Em vésperas do início do julgamento Jogo Duplo, em que vários jogadores, empresários e responsáveis de clubes estão acusados de corrupção desportiva e manipulação de resultados, Moriconi, em vésperas do início do julgamento Jogo Duplo, em que vários jogadores, empresários e responsáveis de clubes estão acusados de corrupção desportiva e manipulação de resultados, Moriconi considera que se está perante um problema que vai além do desporto.
Como olha para este processo Jogo Duplo, o primeiro em Portugal envolvendo suspeitas de manipulação de resultados? Considera que as autoridades, desportivas e não só, estão atentas a este fenómeno de corrupção desportiva?
Será uma oportunidade para que a opinião pública tenha evidência empírica de como o fenómeno penetrou no país. Não entanto, não seria útil fazer girar o problema da manipulação de resultados, somente, em volta do Jogo Duplo porque pode ficar a ideia de que é um fenómeno relacionado com o futebol e com clubes pequenos de campeonatos de segundo ou terceiro nível. O fenómeno, em Portugal e no mundo, transcende o futebol. Estamos perante um problema que vai além do desporto.
A ONU tem uma resolução sobre a corrupção no desporto em que apela aos países para aumentarem os orçamentos por forma a enfrentarem esta questão. Da sua experiência, os países, na sua generalidade, estão sensibilizados para esta questão?
Primeiro é importante aclarar que a manipulação de resultados é uma pequena parte da “corrupção no desporto”. Segundo, a corrupção vai além das leis e pode ser moral. Nem todo o que é legal é justo, nem tudo o que é condenável é crime. No caso concreto de Portugal, nos anos 1990, se um árbitro era descoberto em flagrante a receber um suborno por parte de um dirigente desportivo, não existia corrupção porque a corrupção implicava sempre a participação de um cargo público. Os conceitos mudam. O desporto também: converteu-se num negócio híper complexo, com infinidade de participantes que não têm interesses desportivos, onde tudo está a virar “apostável”. Acho que falta uma discussão séria do que é corrupção desportiva, quer no âmbito legal quer no âmbito moral. Mas para isso é preciso uma discussão prévia sobre a natureza contemporânea do desporto. Quando é conveniente, o desporto ainda é desporto, quando não é conveniente o desporto é puro negócio. Esta ambivalência tem criado inúmeras possibilidades para que o crime organizado penetre na atividade e não só para manipular resultados.
A manipulação de resultados é o grande problema do desporto na atualidade? Principalmente com o aumento de pessoas envolvidas nos sistemas de apostas, nomeadamente online?
A manipulação de resultados existe desde os Jogos Olímpicos da Antiguidade. Mas em vez de avaliar a magnitude do problema por si próprio, prefiro vê-lo num âmbito maior de estudo da criminalidade e da ordem social contemporânea. É um fenómeno relacionado com o crime organizado, o crescimento dos mercados ilegais, a lavagem de dinheiro, a fraude nas apostas. Mas também com a má gestão de algumas instituições desportivas, com a mercantilização do desporto e a vida em geral, com as ideias do que significa o sucesso na sociedade contemporânea, com as características, e às vezes os abusos, do novo mercado de apostas global online.
Leia a entrevista completa no site do Diário de Notícias.
Photo by Edoardo Busti / Public domain
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