Quem tem medo da democracia europeia?
A democracia europeia, lá onde a deixam funcionar, não fica a dever a nenhuma das nossas democracias nacionais.
Meus caros, metam isto na cabeça. A democracia europeia não funciona pela mesma razão que, antes de haver geringonça, era “impossível” a esquerda entender-se em Portugal. Lembram-se? Dantes também havia imensas teorias para a esquerda não se entender: eram os traumas do PREC, era “o PS mais à direita da Europa”, era a sociologia de café sobre as bases eleitorais de cada partido, era aquele sucesso dos verões passados, hoje esquecido, “ajudar o PS a cumprir com o Tratado Orçamental é vender a alma por umas negociações no parlamento”. Nada disso, a explicação era mais simples: os partidos de esquerda não se entendiam porque as direções dos partidos não queriam que eles se entendessem. Ponto final. Quando houve pressão sobre as lideranças dos partidos, passaram a ter de querer. Em resumo: o supostamente impossível precisava de muitas teorias. O possível só precisa de prática.
Com a democracia europeia passa-se o mesmo, a outra escala, com a mesma lógica ou falta dela. Querem tentar convencer-nos que na era da informação digital e das traduções automáticas, das reuniões pela internet e da escrita colaborativa, dos milhões de jovens erasmus e das discussões nas redes sociais através de vários fusos horários serão impossíveis deliberações pan-europeias (ou mais além). Porquê? Porque, dizem-nos, só é possível “discutir e tomar decisões com aqueles que connosco partilham uma língua, uma história, uma cultura e uma comunidade de destino”. Porque, dizem-nos, numa versão política do velho e famoso anúncio da carapinha e da cabeleira loura, o que é natural e fica bem é não haver “democracia para lá do estado-nação”. Como se dentro da nação nós forçosamente nos entendêssemos (Orbán e Soros são ambos húngaros, lembram-se?) e não fosse possível entendermo-nos entre progressistas, conservadores, liberais ou ecologistas de várias nações diferentes.
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