Trump, o Futuro da América e a Política de Identidade
Contra todas as previsões da imprensa, Donald Trump venceu as presidenciais americanas em 2016. Esta vitória choca todos os que pensaram ou agiram como se a história do mundo tivesse acabado com a democracia liberal e o universalismo cosmopolita. No entanto, os sinais de mudança há muito que estavam presentes.
Os EUA estão profundamente divididos em linhas étnicas e morais. Este é um fenómeno que se tem acentuado nas últimas décadas, observando-se há já várias eleições que os diferentes grupos votam em bloco. O grupo dos euro-americanos foi talvez o último a chegar a este conflito identitário, mas agora já não há grandes dúvidas de que o partido republicano é o partido que agrega os seus interesses.
A insurgência Trumpeana
Grande parte dos analistas tenta explicar esta “insurgência” Trumpeana como sendo um protesto dos euro-americanos contra a globalização económica devido à perda de empregos e de riqueza geral. No entanto, uma análise mais cuidada revela que os apoiantes de Trump estão muito longe de serem pobres. Os outros grupos (latinos e afro-americanos) que tendem a apoiar o partido democrata com a sua visão globalizante são bastante mais empobrecidos. Este historicismo materialista dos analistas não consegue explicar o fenómeno Trump em toda a sua dimensão.
Tal como vários estudos académicos revelam, o que está na origem desta insurgência é a ascensão da identidade europeia em solo americano. A evidência empírica dos psicólogos sociais Eric Knowles e Linda Tropp mostra que o contacto massivo com “o outro” no próprio país fez com que muitos euro-americanos se tenham consciencializado da sua identidade europeia. Por outras palavras, a abertura de fronteiras e as alterações radicais demográficas e culturais nos EUA provocaram uma ameaça existencial. Tal como aprendemos com a psicologia política evolutiva, é nestes momentos que os grupos tendem a escolher líderes fortes e combativos que defendam a sobrevivência do colectivo.
Três estratégias possíveis para o futuro
Os EUA vão estar divididos entre três estratégias que irão ditar o seu futuro. Diferentes forças sociais irão puxar para estratégias diferentes.
A primeira estratégia é a manutenção do império americano, do liberalismo, e da ordem internacional unilateral que serve os interesses americanos. Esta opção está a desmoronar-se devido às divisões internas. O que é bom para a “América” como Estado não é já visto como bom pelo grupo que historicamente desenhou as suas instituições. Daí a vitória de um candidato como Trump que sugere a retração do modelo imperial. Contudo, as forças liberais e neo-conservadoras dos últimos 30 anos tentarão continuar a empurrar a política americana nesta direção.
A segunda estratégia é a da promoção do modelo de nacionalismo civil/liberal onde se tenta criar uma identidade americana, unindo todos os grupos que vivem sob o Estado americano. Isto seria o melting-pot de um só país. Hillary Clinton está entre este modelo e o modelo imperial. Já Trump está entre este modelo e a próxima estratégia.
A terceira estratégia é a da assunção do nacionalismo clássico (étnico). Trump é oficialmente um nacionalista civil, mas a sua base de apoio tem um carácter profundamente étnico. Como tal, ele terá de navegar entre estes dois modelos de nacionalismo e os resultados serão imprevisíveis. À medida que os problemas e as divisões se acumularem, muitos que agora hesitam em abandonar uma moralidade universalista poderão abraçar o particularismo. E há certamente fortes movimentos identitários que apontam nessa direção.
Trump unificador?
Muitas questões são de alta importância para o futuro da presidência Trump. Como lidará ele com o papel da NATO? A aliança com a Rússia irá ser consolidada? No entanto, a resposta a muitas destas questões será influenciada pela resposta que Trump irá dar à pergunta “quem somos nós Americanos?”. Tal irá determinar as suas coligações internas e externas. Os EUA estão absolutamente divididos. Optará Trump pela unificação geral ou pelo fortalecer da sua base de apoio? Os próximos tempos serão esclarecedores. Não só para a América, mas também para o ocidente.
Donald Trump, Photo by Gage Skidmore / CC BY-SA 2.0
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