Visão Global 2017: Filipe Vasconcelos Romão
Personalidade do ano: Xi Jinping
O ano 2017 ficou marcado pela chegada de Donald Trump ao poder. Passados quase doze meses, as piores expectativas confirmaram-se e a nova administração fez-se notar sobretudo pelo seu carácter errático. Na dimensão externa, foi evidente a erosão da autoridade da principal potência mundial. A comunidade internacional, com a excepção de Israel, parece ter deixado de contar com os Estados Unidos, em função de uma liderança considerada pouco credível e incapaz de resolver qualquer problema. A forma como Trump voltou a incendiar o Médio Oriente, com um reconhecimento absolutamente desnecessário de Jerusalém como capital israelita, é disso prova.
No entanto, em 2018, os Estados Unidos continuarão a ser a única potência com capacidade de projecção de força à escala global, a contar com o maior orçamento destinado à defesa e a garantir a segurança de dezenas de países. A emergência de uma potência com um peso comparável ao dos Estados Unidos é uma impossibilidade a curto-prazo: a Rússia, apesar de alguma recuperação em relação à decadência do pós-Guerra Fria, não tem peso económico nem demográfico para regressar à primeira linha; e a saída do Reino Unido e a permanente crise francesa debilitam a posição europeia. Resta a China, uma potência que aposta numa estratégia de longo-prazo em detrimento do efeito imediato.
Xi Jinping é a face de uma nova China. A sua reeleição como secretário-geral do Partido Comunista Chinês traduziu-se numa consolidação do poder que detém. Depois de um primeiro mandato centrado no saneamento do partido e do Estado e no combate à corrupção, Xi Jinping está seriamente empenhado na afirmação internacional chinesa. A política externa de Pequim responde hoje a uma estratégia dual: realismo e músculo militar ao nível regional; e liberalismo, soft power e economia à escala global. O pragmatismo impôs-se à ideologia e o governo chinês, embora não esteja disposto a ceder em nada do que considere estratégico, começa a assumir uma postura de liderança, como o demonstra um certo endurecimento de posição em relação aos devaneios norte-coreanos. A abertura da primeira base militar no estrangeiro (no Djibuti), este ano, é outro sintoma desta evolução.
Muito tranquilamente e sem pretender dar qualquer passo em falso, o presidente chinês entendeu perfeitamente que o vazio de poder (e de prestígio) que Trump representa pode servir para afirmar o seu ascendente. Não por acaso, na Cimeira de Davos, em Janeiro, defendeu de forma clara o comércio internacional sem barreiras, em reacção aos discursos mais protecionistas. A denominada “nova rota da seda” é uma materialização desta ambição, com Xi Jinping a articular de forma precisa a política de investimentos e financiamentos em África e na Ásia com a dinâmica industrial chinesa. Na América Latina, por outro lado, a presença manteve-se para lá dos governo de esquerda que durante anos privilegiaram o relacionamento com Pequim.
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