Homens Fortes, Sagas Familiares e as Últimas Eleições Presidenciais no Gabão
No passado dia 27 de Agosto, realizaram-se eleições presidenciais no Gabão. Com um total de 14 candidatos, o incumbente Ali Bongo Ondimba teve como principal oponente Jean Ping, apoiado por uma coligação de partidos da oposição. No dia seguinte à votação, ainda sem quaisquer resultados oficiais ou oficiosos, Jean Ping anunciou-se vencedor. Quando as percentagens finais foram divulgadas pela Comissão Eleitoral Nacional Autónoma e Permanente, a 31 de Agosto, Bongo contava com 49,80% dos votos, contra 48,23% de Ping.
Politicamente hábil, Jean Ping poderia prever que reclamar vitória extemporaneamente seria o detonante para protestos contra uma suposta fraude eleitoral, num contexto, como tantos outros no continente africano, em que o multipartidarismo não é garante de democracia ou de alternância no poder. E foi o que se passou: apoiantes de Jean Ping saíram à rua em protestos que se transformaram em motins reprimidos pelas forças de segurança e que contaram com um número ainda não determinado de mortos, feridos e presos.
O Gabão e a família Bongo
O Gabão é uma república presidencialista e é considerado um país não livre pela Freedom House. Este país é também conhecido pela sua dinastia política: Omar Bongo (ou El Hajj Omar Bongo Ondimba) foi presidente do Gabão entre 1967 e 2009, ano da sua morte. Nesse mesmo ano, realizaram-se eleições, ganhas por Ali Bongo, filho do falecido presidente. A família Bongo concentra poderes, rendas e acessos aos canais de comunicação com a população, importantes em contextos eleitorais, neste Estado rendeiro rico em petróleo em que o nepotismo impera.
Mas Jean Ping não é uma figura distante do regime de Bongo. Foi várias vezes ministro desde os anos 1990, foi presidente da Assembleia Geral da ONU (2004-2005) e da Comissão da União Africana (2008-2012). E tem ligações familiares à família Bongo: Pascaline, irmã do actual presidente, e igualmente política, é mãe de dois dos seus filhos. Mesmo tendo designado Ali Bongo como tirano e apelado a um bloqueio económico na sequência do que considerou ser fraude eleitoral, Jean Ping não pode deixar de ser considerado um homem forte do regime.
Eleições justas e o funcionamento das instituições
As eleições no Gabão contaram com observadores da União Africana e da União Europeia, que não as declararam eleições livres e justas. A oposição reclama manipulação, argumento facilitado pela forma como os resultados se conhecem: não são divulgados à medida que a contagem dos votos se faz nos círculos eleitorais, mas sim na sua globalidade como resultados finais.
A juntar às acusações de manipulação e à repressão de protestos, o regime de Ali Bongo ainda tem como ónus destas eleições a censura e o corte do acesso à Internet e às redes sociais nos dias que se seguiram às eleições.
A Jean Ping, que perdeu por pouco mais de 5.500 votos, resta demonstrar que as instituições estatais funcionam. Por isso, solicitou ao Tribunal Constitucional para que houvesse recontagem de votos, em especial na província de Haut-Ogooué, de onde é originário Bongo e onde terá ganhado por 95%. Esta é uma oportunidade para aferir sobre o funcionamento das instituições democráticas do país, mas ainda se coloca uma questão, uma vez mais ligada à família Bongo. A presidente do Tribunal Constitucional, Marie-Madeleine Mborantsuo, teve uma relação sentimental com Omar Bongo da qual resultaram três filhos, irmãos do incumbente Ali Bongo.
A comunidade internacional pede instituições fortes, provas de transparência e eleições consideradas livres e justas no Gabão. Dentro do país, o movimento Tournons la Page pede um virar de página, que significa a alternância como garante de democracia.
Photo by Foreign and Commonwealth Office / CC BY 2.0
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