Review | As Eleições na América Latina e os efeitos sobre as relações bi-regionais
Realizou-se no ISCTE-IUL, na semana de 2 a 6 de Julho, o Curso de Verão “América Latina Hoje”. Apresentamos aqui o resumo da sessão de dia 5 de Julho em que foram abordadas as recentes eleições no México e na Colômbia.
Os resultados eleitorais mexicanos:
Durante a sessão foram abordados os principais contornos destas eleições.
O que primeiro salta à vista quando falamos dos resultados eleitorais é a impressionante vitória presidencial de Manuel Obrador, com 53,19%. Mais impressionante ainda é observar o mapa com os resultados eleitorais por Estados, em que vemos que Manuel Obrador obteve a vitória eleitoral em trinta dos trinta e um Estados mexicanos. Considerando os resultados nas eleições para o Senado, em que o MORENA de Manuel Obrador obteve a vitória com 37,6% dos votos, obtendo 45,31% dos lugares, e os resultados nas eleições para a Câmara de Deputados, em que o MORENA de Manuel Obrador obteve a vitória com 37,25% dos votos e 38,6% dos lugares, vemos que Obrador e o MORENA foram protagonistas no colapso do sistema partidário mexicano.
O colapso do sistema partidário mexicano:
O grande fator deste colapso é naturalmente a enorme queda do Partido Revolucionário Institucional (PRI), cujo candidato, José Antonio Meade, obteve nas presidenciais apenas 16,41% dos votos. Um resultado que não se revestiria de particular relevância não fosse o atual Presidente Mexicano Enrique Peña Nieto ser do PRI, assim como quinze dos últimos dezassete presidentes. Desde 1928 até 2000 só o PRI ganhou a presidência, num “reinado” interrompido apenas por Vicente Fox, do Partido de Ação Nacional (PAN), cujo candidato em 2018 obteve apenas 22,28% dos votos. Contudo, esta não é a única grande mudança que as eleições de 2018 podem originar.
A queda do PRI não se deu apenas, naturalmente, nas presidenciais. No Senado, obtiveram apenas 10,94% dos lugares, e na Câmara dos Deputados apenas 8,4%. Ou seja, a legislação aprovada nas duas câmaras pode perfeitamente ser aprovada à margem do PRI. Não só legislação ordinária, como também revisões constitucionais – bastante comuns no México, com a constituição atual a já ter sido alvo de mais de 650 alterações individuais. Sendo que, com a vitória presidencial e a quase maioria absoluta no Senado, Obrador e o MORENA ficam em quase pleno controlo das nomeações para o Supremo Tribunal de Justiça, Procurador-Geral da República, Embaixadores e Cônsules, e da ratificação de tratados internacionais.
Os motivos da vitória:
Naturalmente, não chega falar em resultados eleitorais, importa também perceber porque é que ocorreram. Embora ainda estejamos no rescaldo das eleições, para os oradores as eleições mexicanas de 2018 são um exemplo do poder de um líder. Manuel Obrador conseguiu construir uma plataforma eleitoral alargada, integrando inclusive o Partido do Encontro Social, de direita (o MORENA é marcadamente de esquerda). Com esta plataforma eleitoral alargada, e a sua personalidade carismática, consegue concentrar em si o voto daqueles que perderam a confiança na política (escândalos de corrupção, violência, narcotráfico, etc.), em particular os que estavam desiludidos com o PRI e o PAN.
As eleições colombianas:
Na segunda parte da sessão, foi convidado o professor Luis Carlos Infante Sánchez, para comentar brevemente as eleições colombianas.
O sistema eleitoral colombiano, como explicou o professor Luis Carlos, é um sistema maioritário a duas voltas. Na primeira volta das eleições de 2018, destacaram-se três candidatos. Iván Duque, que obteve 39,14% dos votos, Gustavo Petro, que obteve 25,09% dos votos, e Sergio Fajardo, que obteve 23,73% dos votos. Tendo passado à segunda volta os dois primeiros, Sergio Fajardo anunciou o seu voto em branco na segunda ronda, não apoiando nenhum dos candidatos. Era esperado, tendo em conta que os eleitores de Fajardo eram na sua maioria eleitores descontentes com a política, que estes optassem também por um voto em branco. Contudo, embora os votos em branco tenham subido de 1,76% para 4,21%, a subida foi bastante ligeira comparativamente ao universo de votantes em Fajardo. Nesta segunda volta, a margem entre os dois manteve-se praticamente inalterada, com Iván Duque a vencer com 53,98% dos votos, contra 41,81% em Gustavo Petro.
O que mudou:
Contudo, estas eleições não foram eleições “de rotina” para a Colômbia. Primeiro, registou-se uma taxa de participação eleitoral bastante acima do normal para o país. Embora tenha sido de “apenas” 52%, quando consideramos que na Colômbia tipicamente se registam taxas de participação entre os 30 e os 40%, percebemos que algo claramente melhorou nestas eleições. E um possível contribuidor para isso é o segundo fator que faz com que estas não tenham sido eleições normais para a Colômbia: a ausência de ataques por parte das FARC. Ao contrário do que aconteceu em atos eleitorais anteriores, não se registaram quaisquer ataques às secções de voto. Assim, e pela primeira vez, todos os colombianos que o desejaram, puderam ir votar. Graças, naturalmente, aos acordos de paz conseguidos em 2016 que culminaram na entrega de armas por parte das FARC.
Embora, como seria de esperar, os acordos de paz não tenham sido assinados sem contrapartidas. Primeiro, uma das condições impostas foi que o governo colombiano cessasse a fumigação de campos de plantação de cocaína, cujo tráfico é “taxado” pelas FARC e do qual lucram. Com isto, o número de plantações cresceu exponencialmente, tendo a área de cultivo subido dos 40 mil hectares, para os 180 mil. E segundo, está estipulado nos acordos de paz que as FARC têm direito a 5 representantes no Senado e 5 representantes na Câmara dos Representantes. Contudo, obtiveram nas eleições muito menos votos do que o número necessário para obter esses lugares (apenas 52 mil, sendo que são necessários cerca de 70 a 80 mil para eleger um único representante).
No entanto, ambos os candidatos presidenciais apoiavam os acordos de paz. E talvez em parte por isso, na última Gallop Poll (cujos resultados foram lançados no dia da sessão) se veja que os Colombianos estão mais otimistas. Uma boa, e rara, notícia que o professor Luis Carlos confia que se venha a repetir.
Photo:"Piriri-pororo", Fidel Fernandez (2012). Oil on canvas (150 cm x 200 cm).
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