As relações económicas entre França e África: novas tendências e novos desafios

O CIAN – Conseil Français des Investisseurs en Afrique é uma organização empresarial francesa, criada em 1991, que tem entre os seus associados algumas das mais importantes empresas francesas, de diferentes dimensões, que têm investimentos em África (há anos, em Portugal, existia uma organização com características semelhantes designada por ELO – Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Económico e a Cooperação, que entretanto cessou a sua atividade). Estas empresas representam cerca de 80% da atividade económica francesa em África, estimada em cerca de 60 mil milhões de euros.

Na semana passada o CIAN, juntamente com o Institut Immar, lançou, em Paris, a 2ª edição do “Africa Leads 2020 – Baromètre CIAN des Leaders d’ Opinion en Afrique”. Trata-se de um estudo realizado, entre novembro de 2019 e início de janeiro de 2020, junto de 2 432 líderes de opinião de 12 países africanos, nomeadamente, Marrocos, Argélia, Tunísia, Senegal, Costa da Marfim, Burkina Faso, Nigéria, Camarões, República Democrática do Congo, Quénia, Etiópia e Egipto, que representam 56% da população africana. Os líderes de opinião que foram abordados nesta investigação são oriundos, fundamentalmente, de países africanos francófonos, de quatro países anglófonos relevantes no Continente – Nigéria, Etiópia, Quénia e Egipto – e não foram alvo desta pesquisa líderes de países africanos lusófonos ou de países da África Austral. Na ficha técnica do estudo é referido que a definição de líderes de opinião engloba decisores do sector público e privado (altos funcionários, gestores do setor privado), profissões liberais, jornalistas, universitários, e outros membros da sociedade civil, incluindo líderes religiosos.

Da leitura e da análise do “Africa Leads 2020 – Baromètre CIAN des Leaders d’ Opinion en Afrique”, destacamos um conjunto de conclusões que nos parecem particularmente relevantes:

  • 45% dos líderes de opinião entrevistados considera que a situação global do Continente Africano melhorou e 64% estão confiantes no futuro do Continente, devido sobretudo aos progressos que se estão a realizar ao nível das tecnologias da informação (71%), arte e cultura (59%), transportes (56%) e educação (52%).
  • Em relação aos processos de integração regional já realizados, ou em curso, no Continente Africano, existe uma posição muito favorável e dominante dos líderes de opinião que participaram neste estudo: 70% tem uma imagem positiva da União Africana; 94% apoia a implementação da zona de livre comércio africana; e, no que se refere ao lançamento, em 2020, na região da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) da nova moeda ECO, que vem substituir o Franco CFA, 81% dos inquiridos considera este projeto interessante e 50% dos inquiridos considera-o exequível.
  • Em relação ao impacto da actuação dos países estrangeiros em África, os países com avaliações mais positivas e benéficas para o desenvolvimento económico do Continente são os EUA (74%), seguidos da China (73%), Alemanha (68%), Japão (68%), Canadá (67%), Reino Unido (60%), França (56%), Emirados Árabes Unidos (54%), India (51%) e Turquia (50%). Quando se formulou esta mesma questão apenas aos líderes de opinião dos países africanos francófonos, estes indicaram considerar que os parceiros mais importantes para a África Francófona são os EUA (68%), China (65%), Alemanha (62%), Canadá (61%), Japão (60%), Turquia (51%), Reino Unido (51%), Emirados Árabes Unidos (45%), França (45%) e Bélgica (43%). Neste estudo, parecem-nos particularmente relevantes os resultados alcançados pela China, EUA, Alemanha, Canadá e Turquia e, claro, a perceção existente em relação a França.
  • Os órgãos de comunicação social internacionais têm um papel muito relevante na informação e na formação de opinião desta amostra de líderes africanos. Cerca de 50% costumam ver televisão para se informarem, sobretudo a cadeia francesa France 24 (26%) e a britânica BBC (19%), e 27% ouvem as rádios internacionais, sobretudo a Radio France International (78%).
  • As empresas e marcas internacionais presentes em África mais apreciadas pelos participantes deste estudo são, por esta ordem, a Samsung (Coreia do Sul), Toyota (Japão), Orange (França), Dangote (Nigéria), Ethiopian (Etiópia), Coca Cola (EUA), Renault (França), Microsoft (EUA), Nike (EUA) e Safaricom (Quénia).

Este é um estudo particularmente importante porque nos consegue evidenciar, ainda que de forma muito sintética, algumas das novas dinâmicas económicas e empresariais por que passam os países abordados nesta amostra e também a forma como são avaliados e percepcionados alguns dos seus parceiros externos, como os casos da China, EUA, Alemanha, Canadá e Turquia, num Continente que desperta, a todos os níveis, cada vez mais interesse. No que refere a França, e face a análises como esta que acabámos de comentar, existe alguma preocupação em relação ao futuro da relação económica com o Continente e os investidores franceses em África esperam do Presidente Emmanuel Macron “un vrai virage africain”. Para já, e entre outras medidas, o governo francês irá disponibilizar cerca de 2,5 mil milhões de euros para o financiamento de pequenas e médias empresas africanas e irá organizar, no próximo mês de junho, em Bordéus, a 28ª Cimeira Afrique-France, para além de outras medidas em áreas, por exemplo, como a política de defesa em relação à região do Sahel.

Depois de anos de uma relação muito especial de França com África, estes novos tempos, e estas novas gerações africanas, exigem outras estratégias e outros atores!

As opiniões expressas neste texto representam unicamente o ponto de vista do autor e não vinculam o Centro de Estudos Internacionais, a sua direcção ou qualquer outro investigador.
Emmanuel Macron / foto de Remi Jouan / CC BY 4.0

CC BY-NC-SA 4.0 This work is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.

Rui Paulo Almas

Researcher at CEI. PhD in Global Management, Strategy and Entrepreneurship (Iscte). Country Diretor France at AICEP Portugal Global. Former invited lecturer at Universidade Europeia and Universidade Lusíada and former invited trainer at INA – Direcção Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas.

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